domingo, 4 de março de 2012

Parenti Serpenti - Mario Monicelli


A primeira cena deste filme poderá agradar bastante a um certo tipo de turista que goste de caminhar pelas ruas de uma cidade, olhando as pessoas e os prédios. É uma sequência de alguns minutos de plena agitação natalina na Europa. No final, por entre as luzes que enfeitam os prédios, o céu aparece numa modalidade de azul que os pintores de todas as escolas artísticas falharam em reproduzir, e que só tem uma aproximação, que eu saiba, nas fotos tiradas em máquina digital sem flash. Mas eu posso estar ignorando alguma pintura famosa porque azul não é a minha cor preferida.

Mais adiante, os filhos estão na cozinha, conversando agradavelmente sobre como o pai aparenta saúde e bom espírito. "Achei-o melhor dessa vez", diz um. "É verdade", concorda a outra. Alguém resume a impressão geral "Está mais presente". O velho aparece, então, desde o fundo da grande sala, andando com os braços cruzados nas costas, um monumental walk-man nos ouvidos. Está estudando inglês, em preparação para a abertura das fronteiras na Europa. Sua voz é a mesma voz concentrada, militar, que anuncia logo que as pessoas chegam à porta há quantos dias ele não evacua adequadamente. Ainda antes do jantar, com uma boina que alguém deixou em cima da mesa, ele mostra mais uma vez qual a espécie de alienação que o está acometendo. Com essa boina ele pega a enguia que alguém havia trazido da rua, e que deslizava pelo chão, e a atira pela janela. Nessa mesma cozinha, um tanto amorosos, os filhos começam a cantar uma daquelas canções tradicionais italianas para a matriarca familiar. Que depois de alguma resistência se deixa abraçar e beijar, cantando junto com eles, em rodopios esfuziantes de quem sabe que fez macarrão em quantidade suficiente para saciar a fome de todos os presentes.

Pessoas sensíveis também poderão sentir saudades de uma memória distante quando virem a procissão da noite de natal. A que aparece no filme tem uma vantagem inegável a todas as outras, porém. Para acompanhar essa procissão você não precisa sair de casa. Quando o sino que a anuncia é ouvido, basta que você desligue a televisão, faça um pouco de silêncio e beije a mão das pessoas mais velhas. Depois você pode ficar olhando pela janela os padres e coroinhas caminhando lentamente na neve, e guardar outros sentimentos de festividade católica para a Missa do Galo, onde, desde o espaço no alto da igreja, estão cantando Adeste Fideles. Não dá para ver muito bem se as crianças estão usando as túnicas vermelhas e brancas.

Eu estava esperando por uma comédia mais espalhafatosa e cáustica, mas acabou sendo exatamente o tipo de filme que eu queria ver.

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