sábado, 16 de maio de 2009

Lost - The Incident

Este é um spoiler sem pretensões de disfarce. Vamos ver o que acontece neste último episódio da quinta temporada. 

***

A entradinha em que eles mostram o que já aconteceu antes - e que sempre mostra sobre o quê vai ser o programa que está começando - foi com o Daniel Faraday contando como ele descobriu que o evento catalisador de todas as misérias pelas quais todos os personagens da série já passaram na Ilha foi um acidente com uma britadeira perfuradora gigantesca que esbarrou num campo magnético subterrâneo. Na década de 70. Ela conta isso para um Jack e para uma Kate um pouco incrédulos, explicando que a liberação da energia causada pelo acidente fará a Dharma Initiative construir aquela escotilha do Desmond; que essa escotilha é um tipo de mecanismo de controle daquela energia; que um dia o Desmond perderá a cabeça e deixará de apertar os números cabalísticos a cada 108 minutos, e provocará a caída do voo da Oceanic. Conclusão brilhante: se eu pegar uma bomba de hidrogênio que está enterrada em algum lugar da Ilha e detoná-la no local em que as perfurações estão sendo feitas, quem sabe eu consigo enterrar tudo ao redor e neutralizar o magnetismo, assim evitando que a escotilha seja construída, assim tornando desnecessária a presença do Desmond nessa escotilha, assim impedindo que o voo da Oceanic se desvie da sua rota e assim permitindo que todos os personagens cheguem sãos e salvos a Los Angeles, em vez de caírem naquela Ilha maldita. 

Pena que o Daniel morre. Fica para o Jack colocar o universo em ordem. 

O episódio começa mesmo com um homem trabalhando num tear manual, fabricando com bastante cuidado, e inteiramente sozinho, um tecido flanelado. Ele está dentro do que parece ser uma catacumba egípcia. É um homem de uns 30 e poucos anos, não muito diferente de um certo ator da Globo. Esse homem é o homem que comanda a Ilha: Jacob. Ele sai para pescar. Cozinha rudimentarmente um peixe numa pedra. Enquanto almoça ele fica observando uma caravela no horizonte -- certamente aquele navio para onde a Danielle levou todo mundo quando eles estavam precisando de dinamite, e que estava abandonado há um bom par de séculos, no meio da selva. Daí aparece um outro homem, o que está mais em destaque na foto, reclamando de que toda a destruição estava prestes a começar de novo. Ele claramente dá a entender que as pessoas que estavam chegando naquela caravela iriam fazer alguma besteira quando chegassem à Ilha. Jacob responde que as coisas só acabam uma vez, e que tudo que acontece antes disso... é apenas progresso. O sujeito, então, pergunta se o Jacob tinha ideia do tamanho da vontade que ele tinha de matá-lo. Jacob diz que quando esse sujeito finalmente encontrar um loophole para matá-lo, ele vai estar lá, esperando. Quando esse sujeito se despede, a imagem se volta para uma estátua enorme do corpo de um homem com o que me parece ser a cabeça de um jacaré. É aquela estátua que depois nós só vemos o pé dela, e que apareceu uma vez, alguns episódios atrás, quando o Locke e outros estavam viajando pelo tempo depois que o Ben rodou aquela manivela. 

Em matéria de flashback, o que nós vemos é o Jacob surgindo na vida de vários personagens. A primeira que recebe a sua visita é a Kate. Ainda menina, e na companhia daquele sujeito que tem um aviãozinho de brinquedo e que depois de alguma forma ela dá um jeito de matar, ela entra numa lojinha para roubar uma merendeira. O dono da loja, que estava conversando com uma outra cliente, percebe que ela tem alguma coisa na mochila. Ele decide ligar para a mãe da Kate. O Jacob então aparece. Diz que ele paga a merendeira se o dono da loja não fizer nada. Ele se despede da Kate pedindo que ela nunca mais roube nada - o que ela evidentemente deixará de fazer. Outro que aparece recebendo uma visita do Jacob ainda quando criança é o Sawyer. Acontece logo depois do funeral dos pais dele. O Sawyer estava sentado na escada da igreja, a carta que ele escreveu para o homem que causou a morte dos seus pais sendo escrita nas suas primeira linhas "Dear Mr. Sawyer. You don't know me, but I know you". Jacob dá uma caneta para ele. Também a Sun e o Jin são visitados. Na festa de casamento. Quando eles estão recebendo os cumprimentos dos convidados, um homem desconhecido dos dois noivos aparece para dizer que eles devem se amar muito, blá, blá, blá. Este homem é Jacob. Para o Sayid é que a presença do Jacob é a mais trágica. Ele fica parado, num sinal de trânsito. Quando o Sayid está passando com a esposa -- a tal da Ilana --, o Jacob finge que está precisando de umas informações sobre como chegar a algum lugar. O Sayid volta para dar a informação, apenas para ver a esposa ser atropelada brutalmente por um furgão. Já o Hurley se encontra com Jacob quando ele está saindo da prisão. Eles dividem um taxi. Jacob aparece também para o Locke, dizendo que tudo iria ficar bem, quando ele despencou de um terceiro andar, e para o Jack, entregando um chocolate que ele tinha comprado numa vending machine e que tinha ficado emperrado. 


Na Ilha, no núcleo de 1977, Sawyer, Juliet e Kate são colocados num submarino encarregado de deportá-los. A Kate conta do plano do Jack de explodir a bomba de hidrogênio, inicialmente sem sensibilizar o Sawyer para a necessidade de salvar a vida de todas as pessoas que ficaram para trás, mas enfim motivando a Juliet a dar um chute e um soco num soldadinho que estava passando por perto, daí partindo para a tomada do controle do submarino. Os três voltam para a Ilha num botezinho, enquanto o submarino desaparece nas águas. Ainda nesse núcleo, o Radzinsky insiste para o Dr. Japonês (não me lembro agora do nome dele, o pai do Miles) não interromper as perfurações. Enquanto os trabalhos vão seguindo, Jack e Sayid se juntam ao Richard e à mãe do Daniel para levar adiante o plano de explodir a bomba. No caderninho que o Daniel deixou eles encontram algumas instruções, para o bem da história não sendo necessário que a bomba inteira seja transportada para a sua detonação, apenas um dos seus pequenos componentes servindo para o fim de mandar as perfurações para o espaço. O templo subterrâneo onde a bomba foi escondida, por sorte, tem uma parede falsa que dá para o porão de uma das casas da colônia da Dharma. Só o Jack e o Sayid é que levam a bomba, porque o Richard resolve dar um golpe na cabeça da mãe do Daniel logo na hora em que ela ia passar pela parede. Ela desmaia e ele a carrega de volta (eu gostaria de saber como ele fez para sair do templo com ela, ela estando naquele estado, porque a passagem que eles utilizaram para chegar lá era um buraco no meio de um rio). 

No núcleo de 2007 a história é a da travessia da Ilha pelo Locke, o Ben e o Richard, um punhado de gente os seguindo. Destino: a morada do Jacob, precisamente aquela estátua de que hoje só sobrou o pé com quatro dedos. A cada vez que eles aparecem caminhando pela praia o Locke está conversando com alguém. Primeiro o Richard vem reclamar com ele de alguma coisa. Ele diz que o Ben tinha contado para ele sobre como o Locke já tinha morrido uma vez, na ocasião em que ele, Ben, teve de estrangulá-lo. Locke responde que era mesmo bastante charmoso ele ter ressuscitado e tal, assim como era curioso que o Richard jamais envelhecesse. Depois o Locke conversa com o Ben, que então confessa que algumas horas antes, quando eles estavam num templo, o fantasma da sua filha morta tinha aparecido para ele, dando ordens explícitas de que ele cumprisse tudo que o Locke mandasse. O Locke sorri. Que bom, então, que ele não iria precisar gastar muita conversa convencendo o Ben a assassinar o Jacob. 

Ainda em 2007, um grupo de 5 pessoas, entre elas o piloto do voo da Oceanic e um sujeito que é como se o Brendan Fraser tivesse engordado ao ponto de parecer uma pessoa normal, desembarca numa canoa. O piloto pergunta quem diabos eles eram, eles que tinham cometido um espancamento nele com a ajuda de um pedaço de madeira. Eles dizem que eles são os mocinhos da história. Eles estão levando uma enorme caixa de metal, o conteúdo da qual, eu adianto, é o cadáver de John Locke. Quer dizer, a pessoa que apareceu lá na Ilha dizendo-se o Locke ressurgido das cinzas não era o John Locke coisa nenhuma. Essa pessoa não é outro senão aquele homem que aparece conversando com o Jacob no início do episódio, que de alguma forma encontrou o seu loophole é que agora só quer saber de matar o Jacob. Justos céus.

Voltando à década de 1970, Jack e Sayid saem da casa e tentam passar despercebidos na confusão que está acontecendo na vila da Dharma. Sayid arruma um macacão e coloca o dispositivo da bomba de hidrogênio numa mochila. O pai do Ben, no entanto, o reconhece como o homem que atirou no seu filho. Segue um tiroteio. Jack mostra uma habilidade com a arma impensável para um simples cirurgião e uma disposição de entrar na linha de frente impensável para um homem desprovido de um colete à prova de balas. Ele não consegue evitar que o seu amigo seja trespassado por um tiro no estômago, mas consegue carregá-lo pela vila como se nada tivesse acontecido. Jin e Hurley aparecem numa das milhares de kombis que compõem a frota veicular da Ilha, resgatam os dois perseguidos e os levam pela estrada da estação onde as perfurações estão sendo feitas. Miles também está com eles. Só que no meio do caminho havia Juliet, Kate e Sawyer. Eles tinham retornado à Ilha naquele bote, tinham encontrado Vincent (o cachorro do Walt) e a Rose e o Bernard, que estavam vivendo escondidos ali, a apenas cinco milhas da vila. Três anos assim: agricultura familiar, eu suponho, ajudada pelas latinhas de mantimentos providencialmente fabricadas em algum momento da história e em algum momento da história distribuídas magicamente, automaticamente, a todas as pessoas que algum dia colocaram os pés naquela Ilha. Sawyer pediu que Jack lhe desse pelo menos cinco minutos de uma conversa franca no meio da mata, pois era o que bastaria para convencê-lo de que o que tinha acontecido, tinha acontecido, e que agora não adiantava nenhuma bomba de hidrogênio para mudar o passado. Jack resiste a essa concepção. Sawyer o esmurra. Juliet, lembrando-se de como tinha sido o divórcio dos seus pais, de como a sua mãe tinha lhe dito que um dia ela iria aprender que duas pessoas poderiam se amar e, ainda assim, serem insuportáveis uma para a outra, persuade Sawyer a não mais esmurrar o Jack. Ao contrário, a ajudá-lo no plano de explodir a bomba. 

Em 2007, eu já disse, o postiço John Locke está conduzindo os seus liderados para a estátua onde mora Jacob. Eles passam pelo antigo acampamento da praia. A Sun encontra um anel no bercinho do Aaron. Um anel do Drive Shaft. Aquele grupo de pessoas que chegou à Ilha com o piloto da Oceanic e com o cadáver do Jonh Lock The Real McCoy segue para uma cabana. Acho que é a cabana em que alguma vez tinha acontecido alguma coisa. De lá eles seguem para a estátua, não sem antes incendiar o que eles tinham encontrado. Ao chegarem na estátua eles encontram todo mundo, exceto o postiço Locke e Ben, que já tinham entrado dentro da estátua para falar com o Jacob. A tal da Ilana pergunta se tinha um Ricardus por ali. O Richard se apresenta e responde corretamente à pergunta do quê fica na sombra da estátua - um código lá que os membros de algum grupo ainda não bem identificado inventaram para se reconhecerem mutuamente. Daí ela mostra o cadáver do John. A Sun não reage muito bem. "Peraí, se esse aí é o John Locke, quem é aquele cidadão que estava aqui agorinha mesmo, e que está agora lá com o Ben o com Jacob?" 

Ainda algumas coisas acontecem em 1977. A princípio sozinho, depois com a ajuda de mais três pessoas (Kate, Sawyer e Juliet), Jack elimina todos os guardas que estavam ali para proteger a estação das perfurações, os que o Radzinsky tinha mandado chamar. Acho que eu não estou exagerando quando eu digo que esse foi o maior tiroteio da série, um dos maiores que já foram vistos em seriados. Get him, get him, get him. Get him é a única coisa que você escuta até a capitulação final. E então chega o momento da verdade. Jack joga a bomba de hidrogênio no buraco. Todo mundo, Jack,  Kate, Juliet, Sawyer, todo mundo contorce e retorce as expressões simultaneamente de dúvida, esperança, angústia e senso de cumprimento do próprio destino. A música que está tocando alcança um ponto supinamente dramático, apreensivo. Será que vai dar certo? Será que eles vão voltar para a vida da qual eles nunca deveriam ter se desviado? Jack, para o funeral do seu pai. Sawyer, para a sua vida de trapaceiro vigarista. Cumprir a pena de prisão, isso é o que merecidamente aguarda a Kate. Todos os outros serão afetados. Hurley e os seus milhões, Charlie e a sua reencontrada vida de ex-rock star. Claire e o ainda inconcebido Aaron, que poderá ou não ser adotado. O próprio Locke na sua cadeira de rodas.  Sayid, Jin, Sun, todos eles. Num estalar dedos -- sim,  eles chegarão a Los Angeles. A menos, é claro, que o Miles estivesse certo. A menos que Jack, com a sua bomba de hidrogênio, estivesse prestes a causar exatamente aquilo que ele queria evitar -- um desequilíbrio magnético cujos efeitos deletérios só poderiam ser diminuídos pela construção de uma escotilha que funcionasse 24 horas por dia, alguém lá dentro perpetuamente tendo que apertar um botão a cada 108 minutos para que um desastre natural sem paralelos não acontecesse; uma perturbação natural tão grande que o mínimo deslize nessa tarefa de apertar o botão poderia redefinir o que nós sabemos sobre confusão (digamos, o funcionário responsável por essa tarefa, num dia de sentimentalidade, deixando para lá o seu dever e tentando escapar da ilha na qual ele já estava preso por anos, e só depois, em percebendo a grande e perigosa besteira que ele tinha cometido, voltando para a escotilha e apertando o botão, mas já então tarde demais para impedir que algum tipo de magnetismo exótico fosse liberado, quem sabe o magnetismo exótico QUE CONSEGUE DERRUBAR UM AVIÃO QUE ESTIVESSE SOBREVOANDO A REGIÃO?!). Alguém já parou para pensar nisso? 

De novo em 2007, que a essa altura parece ser bastante irrelevante, já que tudo que está acontecendo ali vai mesmo deixar de acontecer quando a bomba de hidrogênio explodir e o universo se reordenar. Ben e o postiço Locke estão dentro da estátua, numa sala ampla. Jacob é visto sentado nessa enorme tumba que é o interior da estátua como alguém poderia esperar ver um professor sentado numa sala de aula, enquanto os seus alunos estivessem fazendo uma prova. Quer dizer, exatamente como se houvesse alguma coisa para ser vista e exatamente como se não fosse estranho ele ficar ali, naquela posição, quando de fato não havia nada para ele fazer naquele lugar não mobiliado. Henri Castelli, eu me lembrei que ele se parece com um cara chamado Henri Castelli.  Jacob começa dizendo ao postiço Locke que ele tinha encontrado o loophole lá do início do episódio. Imbecilmente, retardadamente o Ben fica perguntando se eles já se conheciam. E depois ele faz um discursinho de complexado, queixando-se dos 35 anos que ele passou na Ilha com o Jacob não fazendo senão ignorá-lo o tempo todo. O postiço Locke já tinha provocado o Ben antes dizendo que a verdadeira questão era por que diabos ele não iria querer matar o Jacob? O pior foi o desprezo. "What about me?", pergunta o Ben, indignado. "What about you?", retorna Jacob, impassível. E então o Ben cumpre a sua palavra de matar o Jacob. Ou pelo menos dá duas facadas que o debilitam o suficiente para o que o Locke pudesse terminar o serviço, jogando-o na fogueira. Não sem que antes ele dissesse que tinha alguém vindo. O postiço Locke ficou algo espantado com essa notícia, mas o que me deixou espantado foi que o Sayid tomou um tiro nas vísceras e não morreu -- o todo-poderoso Jacob, duas facadinhas de nada bastaram para liquidá-lo. 

E para terminar com a explosão da bomba. Parece que o Miles estava errado ao dizer que o Jack poderia estar causando o que ele estava tentando evitar. O descontrole magnético, que sai atraindo todos os objetos metálicos para o fundo do buraco, não parece ter começado com a detonação. As ferramentas, os carros e a própria britadeira que estava no local, tudo que era metálico começou a ser puxado para o buraco bem antes de qualquer detonação. Ou seja: o distúrbio magnético aconteceu da forma que o Daniel tinha descrito. Um pouco antes disso houve uma hora em que todo mundo abriu os olhos, depois de alguns instantes de ensimesmamento. Ficou parecendo que eles estavam aguardando a desconexão dos seus corpos com aquele ponto do tempo-espaço para que então eles pudessem surgir em Los Angeles, 30 anos depois. Mas não aconteceu nada disso. Eles estavam no mesmíssimo lugar quando eles abriram os olhos. E o que eles viram foi apenas a anomalia magnética no seu começo. Ou não viram. Jack foi atingido por uma pesada caixa. Juliet, agarrada por uma corrente e arrastada para a boca da fossa. Ela cai dizendo ao Sawyer, que tenta não soltá-la até o último segundo, ela cai dizendo amá-lo. A peça principal da máquina de perfuração, uma enorme estrutura cheia de canos e de uma espécie de caldeira, dobra-se à força da atração e também cai no buraco. E cai uma queda considerável. Abissalmente profunda. A imagem da câmera vai seguindo toda essa parafernália, obviamente gravada por efeitos especiais. Ela dá a noção de como é impossível calcular em termos de metros o tamanho do buraco. Mas, pelo Cálice Sagrado, não é que o corpo da Juliet, estendido no fundo desse vazio, não está, como se poderia esperar que estivesse, completamente desfigurado? Não é que ele está até reconhecível? Cabeça, tronco e membros, essa combinação que jamais alguém poderia antecipar como sendo adequada para ser utilizada nessa ocasião, não é que essa é a forma mais metódica de descrever o objeto que está aparecendo na nossa frente -- cabeça, tronco e membros? Súbito alarme: ela tosse. Pelo amor que você tem a Cristo, minha filha, você acabou de tossir? Será que em se tratando de Lost eu posso usar um critério parecido com o que uso para saber se eu estou dormindo ou não? Quando eu estou deitado, num momento de aurora em que os meus pensamentos se distorcem em sonhos sonhados na noite anterior e notas mentais que eu preciso fazer para o dia que está começando, às vezes eu fico sem saber se eu ainda estou dormindo ou se o meu corpo já despertou. O critério que eu uso é o do espirro. Só espirra quem está acordado. Ou, no mínimo, se a pessoa sabe que espirra, então ela já não está mais dormindo. E a tosse? Eu gostaria de saber sobre a tosse. Será que tossir é prerrogativa dos vivos? Será que uma pessoa que evidentemente esteja morta, uma pessoa que, a não se contrariar toda a verossimilhança, perdeu a vida, senão antes (quando batia com a cabeça em paredes estreitas), quando atingiu o fim de um poço assombroso de fundo, para o qual essa pessoa, é bom lembrar, foi atraída por uma força magnética capaz de derrubar aviões; será que essa pessoa pode tossir? Tossir ou não tossir, eis a questão. O fato é que não dá para dizer se atualmente ela está viva. Ela encontrou a bomba intacta no chão, maldisse todos os diabos e bateu com uma pedra que ela arranjou até que uma enorme explosão branca tomasse toda a tela. 

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