terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Hocus Pocus - Kurt Vonnegut


Uma equação para comemorar quase o centésimo post deste transitório blog:

1926 - 2001 = -75
-75 + 1889 = 1814
1814 + 12 = 1826
1826 : 2 = 913
913 - 900 = 13
13 + 69 = 82

Só quando eu já estava terminando de ler é que a última folha se desatou do resto do corpo do livro, muito mais por culpa minha do que por defeito do produto. Aliás, comprei esse livro na Estante Virtual, na mão de um livreiro bastante solícito. Tão dedicado, eu pensei quando eu fui retirar a minha reserva e quando acabei conversando um pouco com ele, que se por acaso ele souber brincar de estátua, ele pode facilmente ganhar a vida num museu de cera em que o curador queira expor a réplica exata do que era o Woody Allen, por volta de 1991.

Eu tentarei escrever um pouco sobre a história para que assim eu tenha a chance de ir pensando com calma no que pode ser o seu significado. Muito bem. A narrativa é em primeira pessoa. Um veterano da guerra do Vietnã voltando aos Estados Unidos não para se embriagar avidamente e acrescentar mais um débito na conta da Seguridade Social, mas para levar a vida como professor no interior. Eu já não me lembro exatamente de como isso acontece. Foi a convite de um major, ou de algum militar superior, se eu não me engano. Acho que foi a mesma pessoa que, muitos anos antes, ao esbarrar com o Eugene -- o nome do personagem principal -- saindo de uma feira de ciências escolar na qual ele e seu pai haviam tentado perpetrar uma fraude acadêmica, o chamou para se alistar na escola de West Point.

Como usualmente acontece nos livros dele, numa trama em princípio simples aos poucos vão se apresentando desdobramentos imprevisíveis, vão sendo feitas alusões históricas e artísticas desconexas, vão se repetindo idéias fixas obsessivas, tudo isso fora de uma cronologia linear. O ponto máximo de regresso, eu acho, é ao final do século XIX, época da fundação da universidade da qual ele se tornaria professor. De alguma forma essa universidade se especializa em conceder títulos meramente simbólicos a pessoas com patologias diagnosticadas no setor da aprendizagem. Já o futuro é realmente futurista: em 2001 (o livro é de 1990) os EUA se tornam uma nação cujo controle é dispersado entre empresas estrangeiras e milionários árabes. A administração do principal presídio do livro, por exemplo, é feita por uma empresa japonesa.

A todo o tempo o mundo corporativo é comparado a situações de guerra. O chefe da missão japonesa que chega para tomar conta do presídio, por exemplo, é um sobrevivente do ataque nuclear a Hiroshima. Isso serve de pretexto para muitas divagações, a principal delas sendo uma espécie de absolvição moral implícita que é dada ao personagem, talvez o único que não mostra uma natureza torpe quando eclode um grande motim na prisão.

As páginas vão sendo lidas. Algumas coisas vão acontecendo enquanto outras coisas não vão acontecendo. Por exemplo: Eugene mente como pode para conquistar uma mulher num bar das Filipinas. Muito tempo depois, aparece um filho batendo à porta do seu gabinete. Depois de receber uma carta escrita em segredo por sua falecida mãe, o garoto passa a admirar este grande herói tristonho que deve ter sido o seu pai. Alguém a quem tenham acontecido tantas tragédias, afinal de contas, devia ser alguém de caráter. Na única noite que passaram juntos, em todo caso, Eugene inventou algumas mentiras que aceleraram a sensibilidade da mulher quanto à delicada questão de ir para a cama com ele. Mentiras que, mais tarde, moribunda, ela repassaria ao filho, escrevendo uma carta que só poderia ser aberta muito tempo depois. Estamos, agora, no momento em que o filho já leu a carta e finalmente encontrou o pai que ele nunca havia conhecido. Demonstrando toda a sua consternação com o passado:

"You have certainly had some bad luck", he said. "Your father [que nunca botou os pés para fora dos EUA] comes home blind from the war. Your childhood sweetheart [criatura fictícia que todo garoto tem a fantasia de existir, afinal] is hit by a car right before senior prom.
Your brother
[que não nasceu nessa vida] dies of spinal meningitis right after he is invited [o irmão simplesmente não existe, okay?, é tudo uma mentira inventada pelo Eugene] to try out
for the New York Yankees."

2 comentários:

Renata disse...

Gotta love Kurt. And Paul Auster. <3

Neto Torcato disse...

Muito massa.

 
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